
Vivia uma fé de forma um tanto quanto morna e quando lhe falavam
em aprofundá-la, em vivê-la com um pouco mais de intensidade, achava, embora na
maior parte das vezes o não dissesse, que isso era pura demagogia e,
mentalmente, concordava com Karl Marx, que afirmava que “A religião é o ópio do
povo”. Meia dúzia de conversas e tretas que meio mundo inventa para manter
alienados os pensamentos e ideias dos mais doutos. Embora não renegasse, também
não defendia que a fé, como a oração, tivesse qualquer valor no viver feliz do
ser humano.
“És muito tolo” exclamou ao fixar os seus próprios olhos enquanto, nessa
manhã, se barbeava diante de um espelho salpicado de pequenas gotas de água.
Falou de si para si, como se um outro eu o estivesse a censurar por ter vivido
uma data de anos longe de si mesmo e da fé que, pais e catequistas, haviam
tentado incutir-lhe desde a mais tenra infância.
Sorriu por sentir que esses tempos já
lá iam e que o importante era o agora, o hoje em que se sente cheio de força e
ânimo para achar que muitas das coisas do passado, sem deixarem de ser
minimamente boas, podiam ter sido bem mais entusiasmantes e ter sido fonte de
uns bons sorriso, gargalhadas mesmo, e umas “patifarias” num qualquer grupo de
jovens, de vários, para os quais foi convidado a participar. “Que me interessa
isso, agora?”- pensou.
Tinha razão. O passado era passado e
passaria a ser mera reminiscência no futuro porque o presente iria abafar o que
de menos bom pudesse haver dos tempos idos. E isso que lera um dia num livro
que, por breves momentos, folheara enquanto aguardava que uma colega de escola
viesse com meia dúzias de cábulas que ele lhe pedira para um teste de
matemática?
Recordou que a ideia impressa naquelas
páginas lhe gravara levemente a certeza de que a vida somos nós que a
construímos e que não há que lamentar passados nem que empolar futuros porque o
que importa mesmo é o momento presente, porque é esse que importa, porque é
esse, simplesmente esse, que existe. “Tinha razão Chiara Lubich”- pensou.
Sentia, agora, que importava o muito
que ainda teria para viver. Fá-lo-ia com intensidade, e não deixaria de se
manifestar positivamente diante fosse de quem fosse.
Pegou na chave do carro, alisou o
cabelo e, em passo de dança, saiu.
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