sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Amor e Paixão (13)

A porta semi-aberta do café forçou a que, cavalheirescamente, ele recuasse um passo para deixar a Ninfa entrar primeiro. Uma fragrância com tom de uma qualquer especiaria, para ele desconhecida, penetrou-lhe as narinas para se embrenhar no cérebro, agora aliviado e disponível para se deixar marcar por novas experiências de vida. 

A atracão que minutos antes tinha sentido pela Ninfa, de seu nome próprio, Cristina, parecia intensificar-se a cada passo e em cada gesto daquela Mulher, de quem sempre viveu tão próximo, mas também, percebia agora, tão distante.As palavras paixão e amor cruzaram-se-lhe na mente, enquanto ajeitava uma cadeira para que ela se sentasse. Sempre lhe causaram confusão aquelas palavras. Sabia que não significavam o mesmo. Uma e outra vez foi portador de sentimentos diferentes em relação ás mulheres que vinham fazendo parte da sua vida. Amor era  termo demasiado forte para definir o que sentia por uma qualquer mulher. Tinha consciência de que isso era o que sentia por sua mãe e por sua irmã. 

Sensações parecidas sentira-as algumas vezes por outras mulheres, mas aí havia mais confusão porque estava muito atento também fosse ao modo e vestir, ao jeito de andar, ao perfume usado, às palavras que diziam ou ao corpo que tinham. Já antes pensara como era estranhamente interessante e belo que aquelas, a mãe e a irmã, eram mulheres diferentes. Crescera com elas, conhecia-as  ao ponto de não precisar de nada que comprovasse que as amava, bastava-lhe sentir que tudo faria, que a vida daria, se necessário, para que uma e outra estivessem bem. 

Conhecia-lhes o sorriso de alegria, o sorriso disfarçado, o sorriso de dor. Muitas vezes as vira chorar por dentro sem deixarem que as lágrimas  saíssem para fora. Sabia perfeitamente que, como ele, elas dariam a vida para que ele estivesse bem.Agora estava meio perdido ao perceber interiormente que alguns desses sentimentos se manifestavam, mais que tenuemente, pela mulher de sorriso claro que, na sua frente, bebia um café dulcificado por meio pacote de açúcar. Olhou-a nos olhos e sentiu medo, vergonha e encanto. Será que a amava? Atracção sentira-a muita vez. Seriam, agora, apenas sentimentos passageiros. Que fazer?

Um quadro com flores pintadas fazia de fundo, como que emoldurando a cabeça da ninfa. Pensou nas rosas, e no que sentia, quando, no Dia da Mãe, as oferecia à mulher que verdadeiramente amava. Amar era bem mais que oferecer uma rosa, mas a rosa era um pequeno sinal do que sentia por sua mãe. Apeteceu-lhe ter uma rosa para oferecer à Ninfa.

Desejou muito, nesse momento, ouvir o som “quefrô?”…


sábado, 10 de novembro de 2012

Nunca tinha reparado que eras tão bela (12)


Sentia-se com uma capacidade incrível de mudar o mundo todo de uma só vez. Era realmente um homem novo, cheio de sonhos e entusiasmos. Caminhava de cabeça erguida e batida por uma leve brisa, que lhe dava um ar de frescura. Tudo dava a entender que quase voava.

Um pensamento. A mão levada ao bolso. A carteira que lá não estava. Esquecera-se dela em casa. A ideia de ir beber um café, e a constatação de que não levava carteira, despoletara nele uma resma de sentimentos. Inverteu caminho enquanto invertia também o seu humor.

Uma topada numa pedra e um quase cair no chão. Uma palavra, dessas que sua avó tantas vezes tinha chamado de feias. Se antes parecia voar, agora já tinha perdido as asas que o faziam planar de entusiasmo. “Porque diabo, havia de haver sempre alguma coisa a correr mal?” Voltou a casa. Barafustava por dentro e por fora.

Um gafanhoto pousou-lhe sobre o peito. Olhou-o sorrindo e num gesto brusco apanhou-o. Percebeu a força que um tão pequeno bicho exercia com um único intuito: libertar-se das agigantadas mãos que o haviam aprisionado. Abriu a mão e viu-o voar para longe.

A aragem trouxe-lhe pensamentos novos: num momento o gafanhoto está preso e noutro voa para longe. Num momento, ele estava fervilhando de alegria e no outro estava a dizer “palavras feias”, simplesmente porque se tinha esquecido das moedas com que havia de pagar o café. Em simultâneo nasceu-lhe no rosto um inquieto sorriso e a lembrança certa de que a vida é como uma roseira. Belas flores e sonhos que brotam lá no alto e espinhos e dores que impedem que sejam alcançadas num ápice. “O que é belo e bom, leva tempo a conseguir-se”  pensou.

Já saía de casa, novamente, enquanto meditava na certeza de que Deus dá pão e peixe mas não nos isenta a nós de participarmos na elaboração da refeição. Quer os nossos pães e os nossos peixes para que a refeição, como a vida, tenha um sabor humano-divino.

Mergulhado em desabituais pensamentos não se apercebeu de que a Ninfa, alcunha por que era mais conhecida, chegara bem perto dele. Percebeu, isso sim, que estava, hoje, bonita como nunca. Fez-lhe perceber isso. Ela reagiu, franzido o sobrolho, chamando-lhe tonto e garantindo que estava muito normal, até porque nem tinha feito maquilhagem. “Nunca tinha reparado que eras tão bela”, disse-lhe ele, escondendo o facto de que ele é que, nesse momento, se sentia como nunca.

Olhou-a nos olhos, desviou dela o olhar, tinha mesmo que ser, e convidou-a para beber um café. “Não há dúvida de que olhamos sempre os outros segundo o nosso estado de espírito interior”, pensou.

Entravam no café. A porta, apenas semi-aberta,…