Saíra de
casa com ar de galhofeiro pela partida que pregara à mãe. Era feriado e por
isso não tinha que ter ido trabalhar. Fez o que, desde a morte do pai, fazia,
sempre que não tinha que ir trabalhar: umas saídas de casa, uns dedos de
conversa com um ou outro amigo, umas cervejas frescas, que apelidava de loiras.
Na conversa,
com “os três jeitosos”, como lhes chamou quando os vira descambou para a má
língua. Palavra puxa palavra, e Gaby, roída de inveja, e sempre de língua
preparada para cortar na vida fosse de quem fosse, lança a farpa do mal.
Não
imaginando sequer que alguém ali presente se estivesse a sentir morrer de
paixão pela Ninfa, lançou para o ar o viperino veneno dizendo que ela tinha
partido para as Américas para fugir de uma gravidez indesejada. “Tás doida?”
pergunta-lhe a Andreia, enquanto o Henrique franze o sobrolho e pensa “lá volta
ela a atacar quem consegue singrar na vida”.
As entranhas
revolveram-se-lhe e sentiu um ódio frio subir-lhe o corpo. Os olhos
humedeceram-se, os lábios semi-cerrados deram ênfase ao “v” quando lhe disse:
“Víbora. Tens tanto veneno, Gabriela, que sem te dares conta a tua vida acabará
afogada nele” e saiu para não arrancar um par de estalos e lhe marcar a cara
com eles para sempre.
Chorou,
caminhando sem reparar onde punha os pés, nos odores que as flores exalavam, ou
na vida que continuava a acontecer. Pensava no rancor que sentia pela Gabriela:
se já a não “gramava”, acabava-se de vez, nunca mais lhe dirigiria a palavra.
Estava
decidido a nunca falar mal de ninguém “como se pode ser tão injusto, que
interesse tem esta gente em criticar, em fazer mal? Como é que as pessoas não
têm coragem ou capacidade para julgar, em princípio, bem as pessoas? Será que
alguém lucra alguma coisa com o mal que, entre dentes, ou descaradamente se
levanta sobre os outros? Gente hipócrita…” pensava.
O coração só
acalmou o ritmo das batidas ao pensar na certeza que tinha de que ela, a mulher
que amava, partira por ter tido capacidade, por ter lutado e conseguido chegar
um pouco mais longe na vida que ”aquela parva” que nunca foi capaz de sair da
cepa torta” O ritmo cardíaco voltou a acelerar.
Como era seu
hábito desde a transformação que nele se operara pela morte do pai, rebuscou a
memória o procurou a Palavra de Deus e que lhe diria ela sobre o que estava a
viver.
Pensou na mulher adúltera, na trama que se gerou à sua volta e na reacção
de Jesus. Ficou aliviado. Olhou à volta, ninguém via, ganhou coragem,
preparou-se e atirou-se ao rio.