O homem levantou-se, olhou a criança, depois a mãe,
encheu de ar o peito e disse em tom decidido e carregado de alívio: - vou para
casa, tenho gente que me ama e me espera. No momento de partir não consegui
escutar ninguém, a nenhum deles dei ouvidos. Parei a tempo, não sei que força
me prendeu a este banco - disse fixando o olhar frio no banco de madeira - mas
isso não é importante, o que interessa é que agora estou decidido a voltar para
trás, para casa.
Olhou a mulher, em tom jovial e
notoriamente feliz, agradeceu com um obrigado e um sorriso largo, curvou-se,
pegou na pequena mala depositada a seus pés. Ao sair ainda teve tempo para, com
a costa da mão, fazer uma carícia no rostinho da criança pequenina enquanto
recordava que fora a sua mãozita que o fizera tomar consciência da insana
atitude que estava a tomar.
Saiu e dirigiu-se apressadamente
para um dos taxistas que estavam ali parados, pacientemente aguardando que
alguém precisasse dos seus serviços. Trocaram algumas palavras. Entrou no
carro, que arrancou vomitando breves nuvens de fumo negro.
Dezassete minutos foi o tempo
necessário para reencontrar a casa e os que teimosamente tinha decidido deixar,
sem saber para onde ir nem porquê sair. À mãe perguntou pela irmã. Estava
grávida, prestes a ver o rebento que no seu seio se gerava e que, dentro de
pouco tempo, poderia ver de olho vivo e não apenas pelas imagens ecográficas
com que, havia meses já, tinha podido ver que se tratava de um menino.
Olhou o irmão e a emoção
percorreu-lhe a espinha, afinal ele não tinha partido e ela sentia que o não
tinha perdido. Sentia-se quase ser mãe duas vezes ao mesmo tempo: um irmão que
não parte e um filho que vai nascer.
Também a este parece ter agradado
a ideia de que o tio não tenha partido: sem parecer querer sair do materno
ambiente em que fora gerado, estremeceu ao sentir a emoção da mãe. - Até o
menino saltou quando te viu - disse a mãe, como se realmente o bebé não tivesse
simplesmente reagido a uma forte emoção.
Ele, o homem do banco de madeira,
reagiu passando a mão pela barriga prenhe da irmã e num tom suave de voz
exclamou, em jeito de condenação: - como pode alguém querer poder justificar a
morte provocada de um ser como esse que tens aí dentro de ti? Não se trata de
dois simples corpos independentes, ele não poderia ter sido gerado sem ti, ele
dependeu sempre de ti, como pode uma mãe ousar dizer que faz do seu corpo o que
muito bem entender?!
Num misto de dor e alegria, as
lágrimas saíram dos olhos dela porque, nesse momento, e em jeito de flash de
luz tenebrosa, recordou as horas longas que passou em branco no meio da noite
escura depois de o médico lhe dizer que corria risco de perder o bebé.
Apertou o irmão num abraço
forte. Ele afastou-a um pouco, olhou-a nos olhos e disse: - sabes uma coisa
mana?...
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