Já percebemos como o "tempo corre" e como, de um momento para o outro, vão chegando os tempos marcantes da vida litúrgica da Igreja. Está aí a Páscoa e com ela o tempo de preparação que lhe é inerente: a Quaresma.
A muitos não diz nada, a outros pouco mais que nada, consoante a formação e o espírito cristão de que se está marcado. Talvez a olhemos apenas como tempo de jejum e abstinência. São tão poucos os dias a que a isso somos convidados e tão camuflados na exigência de os viver, que se diluem facilmente em desculpas e justificações para serem esquecidos.
Jejum é "comer menos", e abstinência o "não comer carne", por forma a poupar um pouco para partilhar com aqueles a quem falta o essencial para sobreviver. Ameniza-se o desagradável da questão, o não comer o quanto, ou o que, o mero prazer pede, com desculpas de que "o importante é...".
O certo é que jejum é não comer (comer menos) e a abstinência é o não consumir aquilo que dá mais gosto e prazer. Porquê? Se for só porque sim, não tem grande resultado, se for porque se poupa para oferecer, é bom, mas se for por (e para) uma tomada de consciência de que não vivemos para comer, nem para o prazer, é muito bom e dá todo o sentido ao que possamos fazer.
O comer e o prazer fazem parte do bem viver, mas não deveriam, por motivo algum, ocupar a meta do viver nem o meio de a alcançar.
Sentir "fome" e desejo de alguma coisa que me sacie e console e dela abdicar com consciência e vontade, leva-me a pensar que sou espiritual também; filho de Deus; que Nele tenho origem e fim; que Ele se fez, para mim, caminho verdade e vida; que sou apenas uma pequena criatura a fazer caminho, atraída para a eternidade. Abdicar de mim mesmo para que Deus ocupe o centro do meu ser.
Vivendo e gozando tudo em função do tempo e da matéria que sou, limito-me completamente ao pouco tempo que viver e ao querer encher-me do engano de vida que julgo ter. Vivendo e gozando tudo em função da eternidade e da vida do Espírito de que, pelo batismo e por graça de Deus, participo, limitar-me-ei a olhar-me como dependente de Deus e dos outros para me encher de real Vida a que sou chamado e que só depende do caminho que, por livre opção, escolher.
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